Era a grande promessa da reforma dos cuidados primários: dar autonomia funcional e técnica aos profissionais para se organizarem em USF, melhorarem a acessibilidades dos utentes aos cuidados e a qualidade destes e, em contrapartida, oferecer-lhes incentivos financeiros que premiassem o desempenho e os motivassem. Está nos preâmbulos de todos os diplomas legais sobre as USF, o último deles (a portaria 301/2008, de 18 de Abril) fixando o dia 31 de Março para o pagamento dos primeiros incentivos financeiros. Dois meses depois, reina o silêncio.
A denúncia é da Comissão Instaladora da associação de profissionais das USF, que apresentou às Administrações Regionais de Saúde (ARS) o prazo de 30 de Maio para regularizar a dívida. Que não foi paga porque ainda nem sequer foi medido o desempenho dos profissionais e o cumprimento de metas assumidas, lamenta um membro daquela estrutura, Bernardo Vilas Boas. O problema afecta enfermeiros e administrativos das USF de modelo B (as 74 que contratualizam objectivos, únicas visadas por estes incentivos). Se cumpriram objectivos, deveriam ter recebido respectivamente até 3600 e 1150 euros.
A falta de pagamento só muito limitadamente afecta os médicos: a lei previa, para eles, que lhes fosse pago um dado montante até que houvesse um sistema de incentivos organizado. A falta de avaliação do seu desempenho faz com que os incentivos não sejam actualizados - alguns podem merecer mais, outros menos. O certo é que, lembra Vilas Boas, a lei diz que as USF não podem ser responsabilizadas pelo incumprimento das ARS e da administração central. E uma reunião de profissionais marcada para amanhã, no Porto, poderá produzir "formas de pressão".
Admitindo e lamentando o atraso, o coordenador da Missão para os Cuidados de Saúde Primários garante que o assunto vai ser resolvido em breve. "Vai haver resposta". E atribui o problema à falta de fiabilidade do sistema de informação. "Ainda não se conseguiu medir com confiança os indicadores" de desempenho. Isto porque há três softwares em uso, que podem ter divergências ("nem sempre a informação é registada nos mesmos campos), afectando o reporte para o sistema de informação central, situação que tem que ser "afinada". "O pagamento está ligado ao desempenho, pelo que o rigor da medição tem que ser grande para não gerar injustiças".
A questão vai ser debatida hoje num reunião e, segundo Luís Pisco, se não se conseguir uma medição fiável, a solução passará por pagar aos enfermeiros e administrativos um valor fixo até que se consiga. Porque "as USF e os profissionais não podem ser penalizados por uma falha que não é deles", diz. Deverá ser essa a resposta a anunciar "muito em breve" pelo secretário de Estado da Saúde.
Atrasados está também o pagamento de incentivos institucionais. Destinados a todas as USF, premeiam o cumprimento da contratualização da unidade para um ano e deveriam ser aprovados até 28 de Fevereiro do ano seguinte. Mas as avaliações de 2007 só foram concluídas em finais de 2008, não havendo notícias das de 2008. "Estamos atrasados", admite Luís Pisco.
E mesmo os incentivos de 2007 - que visam a atribuição de uma verba até 20 mil euros para aplicar em formação e melhoramento das amenidades da unidade, mediante um plano de aplicação - ainda não foram todos pagos. "Há casos pontuais que implicavam a compra de bens, como automóveis, que não estão resolvidos", diz Luís Pisco.
Fonte Jornal de Notícias (aqui)