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A formiga no carreiro

A crise global combinada com a política de austeridade total prometida pelo Governo vai atirar Portugal para uma recessão em 2011 (uma queda de 1% do produto) e empurrar o desemprego para níveis históricos. Os ordenados do privado vão estagnar, perdendo poder de compra, e o corte na massa salarial no sector público será superior a 11%, o mais violento de sempre e o maior dos 27 países da União Europeia (UE).


Estas são algumas das más notícias ontem ventiladas pela Comissão Europeia, no relatório das previsões de Outono.

Os técnicos do executivo europeu provam o que a maioria dos economistas já avisa há muito tempo: estão reunidas as condições para que Portugal acumule, até 2012 inclusive, meia década perdida no crescimento, no emprego e no bem-estar da população.

Os portugueses vão empobrecer (cada português tornar-se-á no oitavo mais pobre dos 27 em 2012, já ajustado pelas paridades de poder de compra de cada país), enfrentarão quatro anos consecutivos de destruição de emprego e verão assistir a uma subida da taxa de desemprego para 11,1% em 2011 e 11,2% em 2012.


A subida da carga fiscal prevista no relatório afectará a esmagadora maioria dos portugueses, mas tende a pesar mais no bolso das pessoas mais pobres. O aperto ficará completo com a forte redução dos apoios sociais e o congelamento das pensões, por exemplo. Não se sabe ainda o que acontecerá com a actualização prevista do salário mínimo.

É nos salários que o impacto é maior, sobretudo ao nível da função pública: o ordenado médio real dos trabalhadores portugueses (já descontado da inflação) deverá cair 3,5% em 2011, o pior valor de toda a UE. É preciso recuar até aos anos do segundo plano de ajustamento do Fundo Monetário Internacional (FMI), a 1983 e 1984, para encontrar uma degradação superior (-5,7% e -9,2%, respectivamente).

A seguir a Portugal surge a Grécia, com uma perda de poder de compra salarial na ordem dos 2,3% no ano que vem.

A média nacional é fortemente enviesada pelos sacrifícios pedidos a muitos funcionários públicos, actualmente cerca de 663 mil pessoas. Bruxelas aponta para uma quebra nunca vista nas verbas para salários públicos superior a 11% em termos nominais, a maior de toda a UE. Em 2012, a razia continua com um corte de outros 2%. O Governo defende um corte médio da massa salarial na ordem dos 5%. A medida reflecte um controlo extremo na admissão de funcionários.


Apesar do empobrecimento em larga escala, Bruxelas alerta que Portugal falhará o ambicioso plano de redução do défice público prometido. Considera que o país precisa de mais medidas de austeridade para evitar a derrapagem: o Governo defende que o défice vai melhorar dos 7,3% do PIB este ano, para 4,6% no próximo e 3% em 2012; Bruxelas arrasa esta previsão, dizendo que a economia vai fraquejar e a factura com juros explodir. Para Bruxelas, o desequilíbrio das contas públicas vai, afinal, chegar a 4,9% e subir até 5,1% em 2012. Os mercados não gostaram e a taxa de juro da dívida pública atingiu um novo recorde, 7,4%.

 

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http://dn.sapo.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=1723541

Olli Rehn saudou as reformas estruturais em curso em Portugal.

Portugal não foi um ponto da ordem de trabalhos no Ecofin de ontem mas, para tentar afastar quaisquer receios dos seus colegas, o ministro Teixeira´dos Santos prometeu "adoptar reformas no sector da saúde, do mercado de trabalho, do transporte e também no acompanhamento da própria evolução nas contas públicas".


A revelação foi feita pelo presidente do Ecofin e ministro belga Didier Reyenders no final
da reunião extraordinária do euro para travar o contágio nos mercados.

O ministro português das Finanças saiu sem clarificar à imprensa que medidas prometeu em concreto.

Já o comissário Olli Rehn saudou as reformas estruturais em curso em Portugal, adiantando: "Encorajamos as autoridades a intensificar essas reformas" sobretudo no mercado laboral, disse, uma terminologia que vem usando há algum tempo.

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http://economico.sapo.pt/noticias/portugal-promete-reforma-laboral-e-na-saude_105549.html

Empresa do município de Lisboa vai rescindir com 40 trabalhadores, cortar nos salários dos administradores e reduzir a frota automóvel.

 

A Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) anunciou hoje medidas de contenção, que passam pela a rescisão de contrato com 40 trabalhadores, ou seja, 20%  dos seus 186 efectivos.

Entre as medidas enumeradas, a EPUL diz que cortou 5% no salário dos administradores, passou de 31 para 14 automóveis e reduziu o número de direcções de nove para cinco.


Destaque ainda para uma medida, aparentemente, simples. A empresa camarária voltou a funcionar no seu edifício sede, o que implica uma poupança de 800 mil euros por mês que gastava no aluguer mensal de outro edifício.

Pelas contas da EPUL, as decisões tomadas permitem em 2011 reduzir os custos com pessoal em 25%.

Questionada pela Renascença sobre se tenciona solicitar o regime de excepção que permite às empresas do Estado aplicar de forma diferenciada os cortes salariais impostos à Função Pública, a empresa responde apenas que vai cumprir a lei.

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http://www.rr.pt/informacao_detalhe.aspx?fid=92&did=130656

Situação pode complicar-se nas empresas públicas que pedirem «adaptações»

 

O ministro das Finanças garantiu esta sexta-feira que os cortes salariais terão efeitos retroactivos a 1 de Janeiro, caso não sejam aplicados logo no início do ano, nomeadamente nos caso das «adaptações» para as empresas públicas.

Teixeira dos Santos sublinhou que os cortes «têm efeito a 1 de Janeiro», como está previsto na lei.

E serão aplicados aos cortes os mesmos retroactivos do que no caso dos aumentos salariais» (caso tivessem efeito mais tarde, como nos casos em que forem necessárias adaptações), o governante respondeu à agência Lusa: «Sim, claro».

Deste modo, os cortes nas remunerações dos trabalhadores que não sejam efectuados a partir do primeiro vencimento do próximo ano, terão obrigatoriamente de fazer esse ajuste na altura em que o corte for aplicado.

Esta situação pode ser tanto mais complicada no caso das empresas públicas que pedirem para fazer «adaptações», caso elas demorem mais do que o esperado pela Função Pública, podendo o ajuste ser mais brusco, quanto mais tempo demorar a ser efetuado o corte.

Empresas públicas podem decidir onde cortar 5% da massa salarial


 

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http://www.agenciafinanceira.iol.pt/economia/salarios-cortes-salariais-retroactivos-oe2011-teixeira-dos-santos-agencia-financeira/1212646-4058.html?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed:+iol/agenciafinanceira+(Ag%C3%AAncia+Financeira)&utm_content=Google+International

A greve geral desta quarta-feira teve, até as 13 horas, a adesão de 20,1% dos funcionários públicos, segundo o balanço feito pelo Governo. A ministra do Trabalho diz que a "adesão é variável" de acordo com os diferentes sectores, mas que o dos transportes é dos mais afectados.

 

Até às 13 horas a adesão dos funcionários públicos à greve geral desta quarta-feira, convocada pela CGTP e UGT, era de 20,1%, anunciou Gonçalo Castilho dos Santos, secretário de Estado da Administração Pública, em conferência de imprensa.

"Os dados até às 13 horas dizem-nos que a maioria dos trabalhadores está a trabalhar, bem como a larga maioria dos serviços públicos estão abertos ao atendimento", disse.

 

"O número de adesão à greve está na casa dos 78 mil trabalhadores, o que corresponde a 20,1% do universo dos trabalhadores da Administração Pública, directa e indirecta, que são 390 mil trabalhadores", acrescentou.

Nestes números, o secretário de Estado não inclui as autarquias, serviços regiões e empresas públicas.

Ao lado, a ministra do Trabalho, Helena André, salientou que a "adesão é variável de acordo com os diferentes sectores" de actividade, reconhecendo que "a adesão é mais elevada no sector dos transportes".

Neste sector, a ministra referiu que "há paralização total" pela adesão dos trabalhadores à greve, como aconteceu nas empresas Soflusa e Transtejo, ou devido ao encerramento da empresa por razões de segurança, como foi o caso do Metropolitano de Lisboa.

"As informações de que dispomos apontam para uma adesão muito reduzida no sector privado", acrescentou, apontando "o funcionamento dos bancos e da GALP" como exemplos.

 

Desrespeito de serviços minímos terá consequências legais

A ministra do Trabalho garantiu que o desrespeito pela garantia de serviços mínimos da greve geral tem sido reduzido, mas que esses casos deverão sofrer as consequências legais.

"No que diz respeito aos serviços mínimos podemos dizer que é reduzido o grau de desrespeito pelas decisões dos tribunais arbitrais", disse Helena André no balanço da adesão à greve até às 13 horas, acrescentando que "o Governo está seguro de que as instituições de Estado de Direito, também nesta matéria, funcionarão plenamente, retirando dos factos que vierem a ser apurados as consequências legalmente previstas".


"Até agora, esta greve geral tem-se traduzido numa demonstração de grande maturidade cívica dos portugueses, quer dos que decidiram aderir à greve, quer dos que não aderiram", o que do seu ponto de vista este "é um sinal claro de que a sociedade portuguesa, mesmo em caso de conflito, dá prova de grande vigor das suas instituições democráticas", sublinhou.

Além disso, Helena André garante que "o Governo tem nota de um número muito limitado de incidentes de restrições ilegítimas relacionadas com o direito a trabalhar" e que os poucos que existiram "foram prontamente resolvidos".

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http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=1719198

O plano de austeridade elimina 24.750 postos de trabalho na função pública, 7% do total, e prevê a redução dos apoios sociais em 2,8 mil milhões de euros.

 

Draconiano, doloroso, mas inevitável. Expressões usadas pelos analistas para descrever o sexto pacote de austeridade apresentado pelo governo irlandês - agora demissionário - desde que deflagrou a crise financeira, em 2008. Objectivo: reequilibrar as contas públicas (fortemente degradadas devido às colossais injecções de dinheiros públicos nos bancos) e reconquistar a confiança dos investidores. A avaliar pela primeira reacção dos mercados, o segundo objectivo ainda não foi alcançado.

O foco do novo plano de austeridade está na redução da despesa, que irá sofrer um corte de 20%. Mas quase todos os impostos e taxas vão subir - à excepção do que incide sobre os lucros das empresas (equivalente ao IRC português), que permanece nos 12,5%.

O plano tem a duração de quatro anos e pressupõe poupanças de 15 mil milhões de euros, com 10 mil milhões de euros a virem do corte de despesas e os restantes cinco mil milhões através do aumento de impostos.

O governo da Irlanda quer reduzir o défice dos actuais 12% do PIB (32%, sem incluir os custos para resgatar a banca) para 3% em 2014. Para isso, apresentou um conjunto de medidas para os próximos quatro anos que foi considerado, por analistas e economistas, como "doloroso" mas "inevitável".

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http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=455645

Do lado da despesa, serão eliminados 24.750 postos de trabalho na função pública. Os apoios sociais sofrerão um corte de 2,8 mil milhões de euros e o salário mínimo por hora cai 12%, para 7,65 euros. 

Do lado da receita, a taxa normal do IVA vai subir de 21% para 22% em 2013, e para 23% em 2014, enquanto o rendimento mínimo colectável baixa dos actuais 18.300 euros anuais para 15.300 euros por ano até 2014 - a percentagem de pessoas que não pagam imposto sobre o rendimento deverá diminuir, assim, de 45% para 35%. 

O plano de austeridade prevê ainda a criação de um novo imposto imobiliário e de uma taxa sobre os ganhos de capital. E só não mexe no imposto que incide sobre os lucros das empresas. Apesar de algumas pressões internacionais, a taxa de IRC vai manter-se nos 12,5%, continuando a ser uma das mais baixas do mundo desenvolvido. 

Quanto às previsões de crescimento assumidas no plano de austeridade, os economistas consideram-nas demasiado "optimistas". O governo prevê um crescimento de 1,75% em 2011, 3,25% em 2012, 3% em 2013 e 2,75% em 2014. Para James Nixon, economista-chefe para a Europa do Société Générale, "é difícil perceber" como é que a Irlanda vai alcançar este crescimento. 

O governo explicou, em conferência de imprensa, que, nos próximos anos, o motor da economia serão as exportações. Este plano de austeridade, apresentado dias depois de Dublin ter activado o pedido de ajuda internacional, surge após o governo ter implementado (nos últimos dois anos e meio) cinco pacotes de austeridade - avaliados num total de 14,6 mil milhões de euros de cortes. 

Riscos de contágio à Península Ibérica persistem

O presidente francês e a chanceler alemã vão encontrar-se na quinta-feira para debater a crise da dívida soberana que ameaça a Zona Euro. 

O encontro entre Nicolas Sarkozy e Angela Merkel ocorre depois de a chanceler alemã ter alertado para o facto de o risco de mais países da Zona Euro terem que recorrer a ajuda internacional ser "excepcionalmente sério".

Orçamento foi ontem aprovado na especialidade. PS fez aprovar uma alteração que permite às empresas públicas e ao sector empresarial do Estado não aplicar a redução salarial da Função Pública.

 

O Governo suavizou a aplicação das medidas de austeridade no sector público. O PS fez ontem aprovar uma alteração à proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2011 que vai permitir às empresas estatais ficar de fora dos cortes salariais aplicados à restante Função Pública. A CGD deverá ser alvo da excepção, e outras empresas do Estado podem ser abrangidas.

A versão inicial do OE previa uma diminuição entre os 3,5 e os 10% nos ordenados acima de 1500 euros. O corte deveria ser aplicado a "trabalhadores das empresas públicas de capital exclusiva ou maioritariamente público, das entidades públicas empresariais e das entidades que integram o sector empresarial regional ou municipal". Os deputados do PS acrescentaram a expressão "com as adaptações autorizadas e justificadas pela sua natureza empresarial", num claro abrir de portas a excepções.


Questionado pelo CM, o Ministério das Finanças recusou explicitar que empresas já contactaram o Governo pedindo excepção à aplicação dos cortes. "Aplicar-se-á nos casos em que assim se justificar, de acordo com proposta da respectiva administração, desde que autorizada previamente pelo ministro das Finanças", disse o gabinete de Teixeira dos Santos. E explicou que "a adaptação prende-se com o facto de as remunerações nas empresas públicas terem componentes diferentes das remunerações da Função Pública". Há uma única garantia: "A possibilidade de adaptação não abrange remunerações dos membros dos órgãos sociais."


Segundo o ‘Público’, a CGD enviou uma carta a Teixeira dos Santos pedindo um regime de excepção. A gestão justificava tal pedido com o receio de fuga de quadros. Também o Banco de Portugal (BdP) esteve envolvido numa polémica por causa da aplicação da política salarial imposta pelo Governo. Ao CM, fonte oficial do regulador confirmou que a posição do BdP se mantém. "O BdP prosseguirá a sua política de contenção de custos, incluindo os salariais", respondeu a mesma fonte, pondo de lado a hipótese de a instituição vir a pedir excepção.

 

CGD SATISFEITA COM ALTERAÇÃO À REDUÇÃO FISCAL

O presidente da CGD, Faria de Oliveira, afirmou ao CM que está "satisfeito com esta alteração" à aplicação dos cortes salariais, sublinhando que a medida vai permitir ao banco "manter o ‘rating’".

"Não nos eximimos a esforços de redução de custos, mas terá que ser um esforço compatível com o funcionamento da instituição", explicou, lembrando que a medida, tal como estava, criava "consequências graves ao funcionamento da CGD". E afirmou que vai esperar pela publicação da lei para decidir se formaliza a excepção.

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http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/exclusivo-cm/empresas-estatais-fogem-aos-cortes212558137

A notícia chegou às 08.00 da manhã, entre uma torrada do pequeno-almoço, e pela voz de um Manuel descontraído. "Hoje não há escola", disse em tom desembaraçado, sem medir o impacto do que acabara de proferir. Ana e Joaquim Silva, uma típica família da classe média, já estavam de saída para o trabalho quando o comentário do filho lhes alterou drasticamente a rotina. A escola fechada. Para cuidar de Manuel e Maria, os filhos de cinco e dois anos, tinham de arranjar alternativa rapidamente. Ou uma avó ou outra.


O pai, Joaquim Silva, confirmou pelo telefone que o Centro Alfredo Pinheiro tinha as portas encerradas. A adesão do pessoal à greve geral assim o ditou. Às 09.00 da manhã não se via nem ouvia uma criança. Era apenas um das muitas escolas do concelho, visitadas pelo DN, que não abriram. No País, o cenário repetiu-se em milhares de estabelecimentos de ensino, garantem os sindicatos, que reclamam a maior greve de sempre sem ser em protestos sectoriais, com uma adesão de 75%, que obrigou a fechar 2500 escolas.

Como a escola pertence à Misericórdia, Ana confessa que nem equacionou que não abrisse. Foi distracção, reconhece, pois o protesto é global. "Só quando o Manuel disse que a professora já tinha avisado é que me lembrei. Senão tinha batido com o nariz na porta", afirma a mãe. Ana Silva gere uma farmácia em Cascais e só tinha de entrar à uma. "Quando percebi que havia greve, até liguei para a farmácia a saber se era preciso ir a correr abrir a porta", conta, entre risos. Depois, foi a correria habitual. O marido, médico a fazer o doutoramento, teve a primeira aula só às 10.00. Por isso foi a tempo de deixar os filhos em casa da mãe.

Manuel reproduz as palavras adultas que servem de explicação para este dia diferente. "Há uma reunião importante na escola e não podemos lá ficar a fazer barulho", explica, com ar de gente crescida, sentado no sofá da avó Geninha, sem despegar os olhos do canal Panda. A alteração da rotina passa ao lado destes dois irmãos, que trocam mimos e brincadeiras. Afinal, é na casa da avó que já passam algumas tardes da semana dividida com a outra avó. "Hoje vai ser o dia todo", explica Eugénia Silva, que até agradece por a greve lhe ter trazido os netos. Está de chuva, e o dia não convida a sair. As crianças fazem desenhos, conversam e riem. Vai ser assim até à noite.


Menos atento do que Ana Silva, António Ramalho esqueceu- -se de telefonar para o Hospital de S. José a perguntar se a sua consulta de otorrino se mantinha. Resultado: ao contrário da farmacêutica de Cascais, o reformado de 68 anos bateu com o nariz na porta. "Estou à espera da consulta de otorrino há mais de um ano e recebi a carta do hospital há mais de um mês. Agora vou para casa sem saber quando volto a ter marcação", lamentou. "Não liguei para cá porque achei que os médicos não faziam greve. Concordo com a greve, mas não tanto, porque a vida não está para isso", atirou, enquanto saía acompanhado pela mulher.

Portas fechadas, ambulâncias que não passam, ninguém na rua. Era este o cenário à porta das consultas externas do Hospital de S. José, em Lisboa, onde a adesão à greve geral por parte dos administrativos, auxiliares e enfermeiros foi de cerca de 90%. Apenas um papel colado no vidro à entrada do pavilhão e uma funcionária a dar informações: "Hoje [ontem] não há consultas por causa da greve. Está tudo fechado." O cenário de ontem nada tinha a ver com o de terça-feira. Na véspera da greve geral, pouco depois das 08.30, hora a que abrem as portas do bloco das consultas, já a sala de espera estava cheia de doentes para fazerem inscrição, análises ou serem vistos pelo médico. A média diária ronda as 500 consultas.


Mas, em pleno dia de greve geral, foram poucos os que arriscaram sair de casa. Até às 09.15 só cerca de 30 doentes passaram pelo bloco das consultas para saber se teriam alguma sorte. Não tiveram. A porta estava fechada, e, não fosse uma funcionária à entrada, não se veria ninguém. Nem as ambulâncias que estão sempre a chegar com doentes para as consultas apareceram.

"Tínhamos 400 agendadas, e passaram a ser cerca de 200", disse Sandra Marques, administrativa daquele serviço e um dos elementos do piquete de greve. Só em Lisboa, Algarve e Alentejo foram adiadas mais de cinco mil consultas. Em S. José, ontem estavam apenas garantidos os serviços mínimos nas urgências, tratamentos de oncologia, diálise e cuidados intensivos. "Do que sabemos, não se realizou nenhuma cirurgia programada", referiu Ana Amaral, do piquete de greve, durante a manhã. Mesmo na sala de espera das urgências eram poucas as pessoas que esperavam para ser atendidas. "Muitos doentes ligaram a desmarcar." António Ramalho foi um dos que não ligaram.


Sem transporte "há que esperar"

Outro hospital, o mesmo cenário. No Egas Moniz, também em Lisboa, muitos doentes ficaram sem consulta por falta de médicos. Viagens em vão, ainda mais dificultadas pela paragem quase total dos transportes públicos. "Saímos de Cascais às 10.00 para duas consultas no Egas Moniz, mas um dos médicos estava no estrangeiro e o outro fez greve, e agora estamos aqui há já duas horas à espera e vamos ficar ainda mais outras duas", desabafava Maria Mendes, 74 anos, na estação do Cais do Sodré. Sentada num banco ao lado do marido, Maria Mendes não manifestava revolta: "Sou funcionária pública aposentada, e até percebo as razões da greve, agora é esperar."

Sete comboios parados, um invulgar silêncio e um cordão de seguranças a impedir o acesso às plataformas. Este o exótico retrato da estação, pelas 13.00, onde o único sinal de agitação era dado pelas câmaras de TV de estações portuguesas e da TVE. "O último comboio que partiu daqui foi às 09.00", disse ao DN um dos elementos de segurança da CP. Os próximos comboios só partiriam às 16.20 e às 17.10. Para todo o dia, só estavam previstos 15 percursos na Linha de Cascais. Em todo o País, foram suprimidos 1034 comboios da CP, 31 de serviços mínimos, a que se juntaram em Lisboa 562 ligações de barcos da Soflusa e da Transtejo que não foram feitas.


Jacinta Paulo, com uma bebé adormecida ao colo, já mostrava no rosto os sinais de mais de duas horas de espera. "Apanhei o comboio das 07.30 em Paço de Arcos para ir ao SEF tratar de assuntos, dei-me ao trabalho de ligar na véspera para saber se estavam abertos, e hoje dei com as portas fechadas", contou aquela angolana, que não sabia como regressar a casa com a bebé.

Bem mais despreocupada, Sofia Marques, 16 anos, entra a correr na gare, fica estupefacta e volta a sair apressada. Por causa da greve, Sofia não teve aulas na Escola Rainha D. Leonor e tinha marcado uma outra às 15.00 em Cascais com o seu professor de surf. As estações de metro, essas, nem abriram.

Os tribunais também não fugiram à regra seguida por escolas, serviços hospitalares ou estações de transportes, e nem chegaram a "abrir portas". A principal razão foi a adesão de 87% dos procuradores, segundo números do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP).

Apesar de os juízes não terem aderido à paralisação nacional, certo é que a presença dos magistrados do MP é obrigatória na quase totalidade dos actos praticados. Por isso, não surpreende que, no Campus da Justiça em Lisboa, 13 julgamentos tenham sido adiados.


Ontem, em declarações aos jornalistas, o presidente do SMMP, o procurador João Palma, garantia uma adesão à greve de 87%, acrescentando que, face à greve dos procuradores e dos funcionários judiciais, muitos tribunais acabaram por encerrar portas. "Os que não estão fechados estão apenas a assegurar os serviços mínimos", declarou o presidente do SMMP.

Na Comarca da Grande Lisboa Noroeste, dos 66 magistrados, 63 aderiram à greve, sendo que na Comarca do Alentejo Litoral a adesão foi de 100%, segundo o sindicato.

O presidente do SMMP avançou ainda que na Comarca do Baixo Vouga dos 58 magistrados 48 estiveram ontem paralisados. Já no Tribunal de Contas também se registou uma adesão de 100% do MP, enquanto no Tribunal Constitucional dos quatro magistrados três fizeram greve. No caso do Tribunal da Relação do Porto, 10 dos 13 magistrados aderiram ao protesto, enquanto no Arquipélago da Madeira dos 22, 18 fizeram greve.


Quem não pode parar são os polícias, que tinham prometido uma espécie de "greve de zelo" com uma acção mais "preventiva e pedagógica" para com os infractores de trânsito. Esta acção de protesto dos polícias contra a política do Governo começou no passado dia 19 e prolongou-se até ontem, dia 24.

Segundo o presidente da Associação Sindical de Profissionais de Polícia da PSP, Paulo Rodrigues, "houve uma diminuição de mais de 50% de multas passadas pelos agentes das divisões de trânsito de Lisboa e Porto, as maiores do País". Esta percentagem contabiliza apenas os autos de contra- -ordenação levantados entre os dias 19 e 23, pois os de dia 24 ainda não estavam ontem totalmente registados.

Este ano foram passadas 2553 multas, enquanto nos mesmos dias de 2009 esse número foi 4415. Em média foram passadas menos 500 multas por dia. Paulo Rodrigues assegura que estes valores são "oficiais e constam do relatório da PSP". Por outro lado, o Sindicato Nacional de Polícia, também da PSP, autor do contestado pré-aviso de greve, diz que 500 dos seus sindicalistas não trabalharam neste período "por actividade sindical".

A direcção nacional da PSP não comenta estas "baixas", mas contesta os números de multas, alegando que "estes períodos homólogos não são comparáveis, pois as diferenças terão de ser necessariamente notórias face à dimensão de recursos humanos e materiais, concretamente as valências na área do trânsito, que estiveram empenhados desde o dia 15 até ao início do dia 21 de Novembro em Lisboa", por causa da cimeira da NATO.


A adesão à greve nas forças e serviços de segurança que podem fazê--la foi elevada. Na ASAE, 70% dos inspectores e 100% dos funcionários de apoio à inspecção; na Guarda Prisional 93%, e em 15 prisões de Lisboa, Porto e Coimbra, 100%. No lado oposto, os inspectores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras: apenas 10% fizeram greve.


O dia ideal para ir à Loja do Cidadão

Carta de condução, Segurança Social e cartão do cidadão, tudo tratado em uma hora. Uma situação inédita na Loja do Cidadão das Laranjeiras, em Lisboa. E, claro, Rui Fernandes, 72 anos, não podia estar mais contente. Atravessou o rio Tejo, acompanhado da mulher e do filho, já passava das 10.00, e despachou-se a tempo de ir almoçar a casa. O dia de greve revelou--se o ideal para tratar da papelada.

O responsável pela Unidade de Gestão em causa confirma: "O dia com menos utentes de sempre!" Basta olhar para o balcão da Segurança Social, que atende uma média de 500 pessoas por dia e que chegam a esperar três horas, para ver a diferença: às 13.00 de ontem, hora habitualmente de ponta, estavam cinco funcionários e três utentes. O panorama é idêntico nos restantes balcões, os serviço a funcionar, nem todos a 100%, e as cadeiras dos utentes praticamente vazias.

Menos sorte apenas teve quem pretendia dirigir-se às unidades da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, da Caixa Geral das Aposentações, do Ministério da Saúde e do Balcão Perdi a Carteira. Isto durante a manhã, e quando a percentagem de adesão à greve era de 33%. No turno da tarde, fechou, também, o serviço do cartão do cidadão.


Vítor Pinto, 62 anos, reformado, vive no Norte mas tem casa na capital. "Vim a Lisboa para tratar de assuntos. E experimentei vir à Loja do Cidadão para ver se funcionava. Está óptima. Precisava de mudar o registo de propriedade de um automóvel e demorei sete minutos, quando costumo esperar uma hora. Isto está tão vazio que, agora, vou a casa buscar as leituras da água e electricidade", exclama.

As lojas do cidadão registaram números médios de adesão à greve, segundo a monitorização feita no Ministério das Finanças e Administração Pública. É neste ministério que se verifica a segunda maior paralisação na Administração Central, 42,84% dos trabalhadores em greve, com 137 serviços encerrados (36,05%).O Ministério da Justiça ocupa o primeiro lugar, com 48,99% dos funcionários a aderir à acção de protesto e 25,76% dos serviços fechados. O Ministério da Defesa é quem contabiliza menos grevistas, 6,11% do pessoal.

O secretário de Estado da Administração Pública, Gonçalo Castilho, explica que os dados foram introduzidos directamente pelos chefes de serviço, através de uma chave de acesso ao sistema, sendo estes actualizados automaticamente ao longo do dia. E quanto às diferenças dos números: menos de metade do anunciado pelas contas dos sindicatos, sublinha: "Com esta demonstração, fica claro como é que surgem os números, a justificação para a disparidade deve ser dada pelos sindicatos." Mas acaba por argumentar que pode haver elementos de ordem técnica. "Num serviço que fecha as portas, as estruturas sindicais contabilizam todos os trabalhadores, grevistas ou não, ou podem estar a contar pessoas que estão de férias ou de licença", justifica.

Na Administração Central contabilizaram 424 973 potenciais grevistas e 28,56% fizeram greve, o que levou ao encerramento de 3090 serviços (29,28%). Gonçalo Castilho não soube dizer a totalidade dos funcionários.


Já a nível da Administração Local o panorama foi bem diferente. Se fosse elaborado um ranking dos municípios com maior adesão à greve geral de ontem, dificilmente Vendas Novas, distrito de Évora, deixaria escapar o primeiro lugar: câmara e junta de freguesia estiveram encerradas, com adesão de 100% dos trabalhadores. O lixo ficou por recolher. O agrupamento de escolas não chegou a abrir. No centro de saúde, apenas houve consultas de urgência. A conservatória fechou. E até numa instituição particular de solidariedade social, encarregada de servir refeições às escolas, 90% dos funcionários aderiram à paralisação.

"Se os deixassem, até os militares tinham feito greve. E têm razão para isso, pois também lhes vão aos ordenados", diz João Vieira à entrada de um parque de estacionamento junto à estrada nacional que atravessa à cidade. À direita, uma faixa da CGTP lembra que a câmara está encerrada. À esquerda, na Escola Prática de Artilharia, é como se nada se passasse.

Pelas 05.00 da manhã já José Leitão andava pelo parque industrial a conferir os níveis de adesão à greve na Karmann Ghia (indústria automóvel), uma das maiores empregadoras do concelho. No sector privado houve menos gente em greve . E o sindicalista explica porquê: "As pessoas têm medo de perder o emprego, há muita precariedade, e até houve quem oferecesse 25 euros aos trabalhadores, a pagar em Dezembro, para que estes não fizessem greve."

O Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) indica uma adesão de 90%, contabilização que Associação de Municípios Portugueses não faz. Mas, "pela primeira vez, sectores que não costumavam aderir fizeram greve", disse Fernando Ruas, presidente da estrutura. E confirma "a percepção de que a greve atingiu todos os municípios com maior intensidade em relação a greves anteriores". A câmara a que preside, Viseu, regista uma paralisação de 17% e o encerramento dos serviços municipalizados e da fiscalização.


José Marques, do STAL, salienta que encerraram os serviços de atendimento das câmaras de "Barreiro, Seixal, Avis, Arronches, Alcochete, Alcácer do Sal, Nisa, Marvão, Coimbra, Montijo, Moita, Almada, Coimbra, Loures, Gavião, Grândola, Matosinhos, Alter do Chão, Almada, Loulé, Crato, Palmela, Santiago do Cacém, Matosinhos, Castelo Branco, Évora, Famalicão e Vila Franca de Xira.

No plano da cultura, a greve geral fez com que vários museus fossem encerrados. No Museu dos Coches, um aviso na porta informava que se encontrava fechado devido à greve. Já no Museu Berardo não houve registos de trabalhadores em protesto e tudo decorreu normalmente. Ermano Trentini, um turista italiano, disse que já tinha sido informado pelo posto de turismo de que alguns museus poderiam estar encerrados. E reconheceu que, no país natal, uma greve como a de ontem também faria sentido.


O feriado tramou o piquete na Galp

São 05.45 e, à porta dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Jorge Trindade controla os acessos. "Não passou ninguém. Estamos todos solidários com a luta, incluindo os espanhóis que estão cá a acabar o navio para a Galiza", explicava, já durante a manhã, à reportagem do DN, enquanto o maior construtor naval português simplesmente parava a produção. Praticamente 100% de adesão à greve nos 760 trabalhadores da empresa, aos quais se juntaram 200 espanhóis que estão a terminar em Viana do Castelo um navio do construtor galego Barreras, que aluga a doca principal e alguns operários à empresa pública.


À porta da empresa, um dos dois piquetes de greve, com uma dezena de trabalhadores, controlava, atentamente, todas as entradas. António Marques, desenhador dos ENVC há 35 anos, repetia a greve de 2007. "Não faço greve pela situação da empresa, que era de falta de trabalho e que agora está mais controlada, mas pelo ataque que estão a fazer aos direitos dos trabalha-dores", dizia ainda, sem esconder o frio que se fazia sentir no acesso à empresa.

Mais ingrata foi a tarefa de Hélder Guerreiro. Os últimos dias foram ocupados pelo sindicalista a tentar convencer os trabalhadores da refinaria da Galp em Sines a aderirem maciçamente à greve. Mas o apelo à mobilização esbarrou com o feriado municipal daquela cidade alentejana. É que, pelo facto de terem trabalhado ontem, os funcionários da petrolífera auferiram uma remuneração de 300%. Resultado: a paralisação registou uma "adesão zero" ao nível da laboração contínua e não atingiu os dois pontos percentuais no sector administrativo.


"Só se eu não estivesse bom da cabeça é que faltava hoje. Tenho a possibilidade de ganhar o equivalente a três dias, e ficava em casa?", questionava Paulo Silva, um dos trabalhadores da Galp, admitindo que, se fosse um dia normal "até era capaz de aderir", mas nunca lhe passou pela cabeça deixar de ganhar os cerca 300 euros a que tem direito sempre que trabalha num feriado. O argumento era transversal aos colegas, para quem só o dia de ontem "já paga a letra do carro".

Também nas imediações das sedes das grandes empresas ainda com participações públicas como a PT (Fórum Picoas) ou EDP (Marquês de Pombal) a calma reinava.

"Foi um dia normal, aqui não se notou que fosse dia de greve", confirmava uma funcionária da segurança na portaria da sede da EDP, que preferiu não ser identificada. Em relação à PT, fonte da empresa assegurou que tudo correu dentro da normalidade, acrescentando que seria ainda prematuro avançar com números de adesão por causa dos diferentes turnos praticados na empresa.

Quem passasse à porta da EPAL, em Lisboa, mesmo que não tivesse contas para pagar, parava inevitavelmente , porque o facto de as suas portas estarem abertas ao público num dia de greve geral gerava admiração. Apesar de esta empresa pública ter sido uma das muitas que aderiram à greve, os seus serviços mínimos, juntamente com o facto de muitos utentes pensarem que este serviço estaria encerrado, garantiram um dia calmo, em que lá aparecia um cliente de dez em dez minutos. Segundo fonte da empresa ao DN, que confirmou o cumprimento dos serviços mínimos acordados com os organismos sindicais, aderiram à greve geral 17% dos seus trabalhadores (133), num universo de 777.


Já no interior das instalações de outra empresa pública, a RTP, permaneceram parados os carros de exteriores. "Para o jogo Sp. Braga- -Arsenal, a RTP alugou um carro à empresa espanhola da Media Luso e pagou 35 mil euros. Se tivesse ido o nosso carro de HD, teria custado à empresa apenas 19 mil euros", revela ao DN Clarice Santos, secretária-geral do Sindicato dos Audiovisuais, que adianta que a estação pública de televisão teve "uma adesão de 75% e em alguns sectores chegou aos 100%".

Clarice Santos conta ainda que a Administração da RTP se portou "de forma cordial com o piquete de greve", que se manteve durante todo o dia junto às instalações, na Av. Emídio Navarro. "O José Marquitos cumprimentou-nos, assim como o José Fragoso, director de Programas", sublinha. Na Lusa, a adesão à greve também "chegou aos 75%", segundo Nádia Rodrigues, elemento do órgão representativo dos trabalhadores. No piquete da manhã estiveram cem pessoas, vestidas de negros e com cartazes, que contaram "com a presença de Catarina Martins, deputada do Bloco de Esquerda".


Mas também houve quem quisesse fazer greve e não pudesse. Uma alteração, de última hora, nas escalas do Serviço de Transportes Urbanos de Viseu (STUV) impediu que os trabalhadores aderissem à greve. Os efectivos foram substituídos pelos contratados, mas nem assim estes motoristas deixaram de protestar.

António, que para "não ser perseguido" preferiu o anonimato, motorista do STUV, tencionava aderir à greve, "como em tantas outras", mas acabou "traído por uma alteração na escala". Na segunda-feira, as escalas foram alteradas e ao serviço passaram a estar "os contratados com horários parciais e em situação mais precária". Uma alteração "feita propositadamente, porque a administração conhece os trabalhadores grevistas, marcou-os, e sabia que se os colocasse ao serviço eles iam falhar". Entre os "potenciais grevistas estavam trabalhadores efectivos, com direitos e que a administração conhece e sabe quem são", adiantou o trabalhador.

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http://dn.sapo.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=1719892

Para o snack-bar 'O Saboroso', a greve geral começa bem. Ao balcão, Nuno, 36 anos, já perdeu a conta às imperiais. "Foram umas 100 na última hora. Devíamos ter encerrado à meia-noite, mas ficámos até este pessoal querer." O "pessoal" é o piquete de greve do Metro, que fechou portas às 23.30 e se junta, coletes encarnados (CGTP) e amarelos (SINDEM) na entrada de serviço da estação Parque e, do outro lado da rua, frente ao Saboroso, em amena confraternização. No meio da pequena multidão está o líder da Intersindical, Manuel Carvalho da Silva, para quem esta é a quarta paragem da ronda nocturna que iniciou às 20.00 no aeroporto, na entrada de turno dos sapadores bombeiros (o secretário- -geral da UGT, João Proença, começou às 21.30 na Carris e entra no dia 24 nos Serviços Municipalizados de Loures).


Francisco Louçã passou cá mais cedo, Garcia Pereira, do MRPP, fica uma hora e ainda vão aparecer Francisco Lopes, candidato do PCP à presidência, e o secretário- -geral dos comunistas, Jerónimo de Sousa.

Do balcão do Saboroso, Nuno enfrenta imperturbável tanto entusiasmo. "Porque é que havia de fazer greve? Para protestar? Por que é que havia de protestar? Se não estiver bem mudo-me." Garante até que "há muita gente que não quer é trabalhar, preferem receber o subsídio de desemprego". O grevista Luís Assunção, 41 anos, 20 de Metro como "técnico administrativo", assente: "Pois, e o rendimento mínimo."


Asserções que, Rita Santos, 37 anos, operadora comercial (vendedora de bilhetes) e filiada na CGTP decerto refutaria, se com elas confrontada. "Concorri durante dez anos para entrar no Metro porque trabalhava em hotelaria e não tinha nenhuma estabilidade nem progressão na carreira, nada. Queria uma empresa que me desse valor enquanto trabalhadora." E, admite, encontrou - mesmo se hoje está aqui para "mostrar o descontentamento".

Na hotelaria trabalha ainda Carmo, que está de serviço, entrando e saindo da cozinha, no pequeno refeitório da CGTP, onde Manuel Carvalho da Silva e Mário Nogueira almoçam após a conferência de imprensa das 13.00. Caldo-verde, frango assado, arroz de hortaliça a meio de um dia em que a maioria dos presentes não foi à cama e que só terminará perto das 21, após o último "ponto da situação" para a imprensa. Questionada sobre se está a fazer greve, Carmo primeiro diz que sim, mas acaba por confessar que não. "Acho que vou receber este dia, se estou aqui. Mas não tenho nada que ver com a CGTP." Uma fura-greves numa das sedes do protesto? Ao lado, Carvalho da Silva sorri, sem comentários.


Ao fim da noite, na reunião final dos dirigentes da UGT na respectiva sede, João Proença adianta uma novidade que talvez explique o paradoxo. "Há muitos trabalhadores que fazem greve, mas depois apresentam uma justificação - baixa ou outra - para receberem o dia." Talvez Carmo, ao contrário, trabalhe e desconte o dia, como o universo dos sindicalistas. Uma trapalhada que explica a assumida dificuldade nas estimativas, mesmo se na conferência de imprensa conjunta, iniciada às 17.00, Proença de Carvalho e Carvalho da Silva garantem a sua "grande alegria" com "uma extraordinária greve-geral em Portugal" e atiram para o alto, adiantando que dos três milhões e 800 mil "trabalhadores activos", um milhão dos quais do sector público, só 800 mil não terão feito greve. As tentativas de perceber o fundamento da estimativa deparam com a refutação irónica dos números apresentados pelo Governo: "A senhora ministra[do Trabalho] diz que nos serviços públicos a adesão andou entre 5% e 95%. Se tivesse dito entre zero e 100% tinha a certeza de acertar."


Quanto aos efeitos práticos da jornada, Proença resume: "É fundamental que não haja um novo PEC e que muitas das medidas sejam alteradas." Carvalho da Silva reforça: "É obrigatória a reposição da protecção social. Queremos diálogo e negociação." Mas a resposta à pergunta sobre pedidos de audiência ao primeiro-ministro e ao Presidente desencadeia uma risada na sala: "Ao primeiro-ministro já pedimos antes. E a qual Presidente?" Carvalho da Silva explica: "Não vejo o professor Cavaco Silva, o actual PR, a pôr em causa a promulgação do orçamento."


Ao fim de quase uma hora de conferência de imprensa, os dois aliados despedem-se dos media: "Obrigada pelo vosso esforço." O esforço de quem, no caso, não fez greve - mas se todos os jornalistas fizessem, para quem falariam os sindicatos?

 

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