Corte nos subsídios, rescisões amigáveis na função pública, congelamento de reformas antecipadas estão entre os passos que Governo quis dar mesmo sem lhe terem sido exigidos
O memorando de entendimento assinado com a troika trouxe muita austeridade, mas o Governo foi ainda mais longe. Muitas das medidas e reformas introduzidas no programa de assistência financeira foram, na verdade, mais severas do que as negociadas há um ano.
O memorando de entendimento foi aprovado em Conselho de Ministros a 5 de maio de 2011, faz amanhã um ano, depois de um processo negocial que envolveu o Governo de José Sócrates, uma equipa do PSD (então maior partido da oposição) liderada por Eduardo Catroga e representantes da Comissão Europeia, do BCE e FMI.
Dois dias antes, o então primeiro-ministro dirigiu-se ao país pela televisão, num discurso onde explicou o conteúdo do memorando. José Sócrates fez questão de desmentir «notícias especulativas publicadas pela imprensa» sobre medidas que poderiam ser incluídas no acordo.
No discurso, enumerou uma série de medidas que não iriam constar do memorando. Algumas delas, porém, acabaram mesmo por ser aplicadas ao longo do último ano:
Subsídios: «[O acordo] não mexe no 13.º mês, nem no 14.º mês». Acabou por mexer depois, já com o Governo de Passos Coelho que impôs, ainda em 2011, uma sobretaxa especial sobre o subsídio de Natal. De 2012 até, pelo menos, 2014, subsídio de férias e Natal serão cortados a funcionários públicos e pensionistas.
Função Pública: «Não haverá despedimentos», disse na altura Sócrates, como lembra a Lusa. Não houve de facto despedimentos na função pública. O atual Governo tem reiterado, porém, a necessidade de reduzir o número de funcionários públicos.
E elaborou uma proposta, que vai agora discutir com os parceiros sociais, para abrir a possibilidade de negociar rescisões amigáveis no Estado.
Pensões: «Não haverá privatização da Segurança Social, nem plafonamento das contribuições, nem alterações à idade legal de reforma». Certo é que o atual Executivo está a contemplar a introdução do plafonamento das pensões, isto é, a possibilidade de os contribuintes poderem optar, acima de determinado montante, entre manter os descontos para o sistema público ou desviá-los para o sistema privado. Mas não é uma reforma urgente.
Quando às alterações à idade de reforma, por enquanto ainda nada foi avançado nesse sentido. No entanto, o Governo anunciou em abril o congelamento das reformas antecipadas.
Défice: «Este é um programa para três anos que define metas para uma redução mais gradual do défice», dizia Sócrates.
As metas orçamentais mantêm-se iguais às anunciadas por Sócrates - «5,9% do PIB este ano [2011], 4,5% em 2012 e 3% em 2013». Mas o entendimento conceptual quanto ao programa mudou.
Sócrates referia-se a um programa «para três anos», incluindo 2011, 2012 e 2013. A propósito da suspensão dos subsídios de férias e Natal, o atual ministro das Finanças também se referiu a 2013 como o último ano em que se aplicariam.
Vítor Gaspar admitiu depois o «lapso,» esclarecendo programa se estende até 2014: «Essa minha afirmação não altera o período de vigência do programa, que está fixado desde o início, isto é, 2014».
Orçamento: «Não são necessárias mais medidas orçamentais para 2011». O Governo de Pedro Passos Coelho anunciou outras medidas adicionais significativas ainda no ano passado, entre as quais a sobretaxa sobre o subsídio de Natal e a transferência do fundo de pensões da banca para a Segurança Social.
Mercado do trabalho: «As medidas baseiam-se, essencialmente, no acordo tripartido que celebrámos em março [de 2011] com os parceiros sociais».
Entretanto, foi assinadojá em 2012 um acordo dque contempla medidas para o mercado de trabalho que não faziam parte do memorando. Exemplo disso é a supressão de quatro feriados ou a redução do máximo legal de dias de férias de 25 para 22.