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A formiga no carreiro

Memorando de entendimento condiciona programa de Governo: tirado a papel químico e mesmo assim vai mais longe

 

O Governo foi eleito há um ano e o programa para a legislatura ficou imediatamente condicionado pelo acordo com a troika.

O memorando merece aliás referência cimeira no programa, não fosse ele o principal responsável pelas medidas elencadas no documento, refletidas também no Orçamento do Estado. Se dúvidas houvesse, o texto é claro: «Cabe cumprir os objetivos orçamentais estabelecidos no Programa de Apoio Económico e Financeiro a Portugal».

Mas cumprirá o programa as promessas eleitorais? Fomos ver e convidamo-lo a fazer o exercício de encontrar as diferenças. 

Numa primeira leitura, o programa quer diminuir a despesa e aumentar a eficiência da Administração Pública: que não haja dúvida que a despesa foi cortada, sobretudo pelos subsídios de férias e de Natal, e que a regra da diminuição de pessoal está bem presente. 

Houve mesmo medidas extraordinárias, como um imposto especial sobre o subsídio de Natal ou corte dos subsídios dos funcionários públicos para os próximos anos, o que já valeu ao Governo a crítica de ser «mais troikista do que a troika».

Mas a fusão de instituições, a eliminação e racionalização de empresas públicas está longe de ser concretizada. Uma bandeira desfraldada muitas vezes em campanha, mas que na prática não é fácil de executar: o Governo tenta recolher dados para perceber por onde deve começar a extinguir. «Urge reduzir substancialmente o Estado Paralelo», escreve o Governo no seu programa. «Urge», mas ainda falta.

Quanto à reforma do processo orçamental, é caso para dizer que o Governo prometeu e cumpriu com a criação do Conselho de Finanças Públicas, que aliás já produziu o seu primeiro relatório. Mas não deixou o ministro das Finanças contente com a conclusão. Resta saber se o objetivo era apenas criar o conselho ou seguir os conselhos de Teodora Cardoso.

No capítulo dedicado às finanças públicas, a eliminação dos direitos especiais do Estado enquanto acionista recebe um «visto»: as golden shares que detinha na PT, EDP e Galp foram alienadas.

Já encontrar um comprador para o BPN até ao final de Julho de 2011 leva falta por atraso: a proposta do BIC só foi aprovada no fim do ano passado, mas a assinatura do contrato de venda demorou meses e só recentemente ficou pronto. 

Ainda na banca, a CGD deverá vender as suas participações no setor dos seguros, saúde e noutras áreas não estratégicas, mas o processo ainda decorre.

A privatização da TAP e da RTP também estão em andamento. Mas a venda da televisão pública não ficará concluída antes de 2013 - depois do calendário ter sido protelado.
Quanto a reorintar a estrutura do crédito para os bens e serviços transacionáveis era preciso que, de fato, a liquidez da banca permitisse a cedência de liquidez às empresas para que houvesse efetivo apoio às exportações e internacionalização de empresas. Houve já a criação de uma nova linha de crédito às empresas, sobretudo às PME, mas primeiro, e tendo em conta a conjuntura económica, o Governo preocupou-se com a criação de uma linha de crédito para empresas em dificuldades. 

A avaliação dos contratos de Parcerias Público-Privadas, e a renegociação dos contratos, está no programa e no memorando da troika. O anterior ministro das Finanças chegou a dizer que renegociar as Parcerias Público Privadas era uma «ilusão». Mas este Governo, ancorado no memorando, é obrigado a discordar; o secretário de Estado promete poupar 4 mil milhões e, se não conseguir, ameaça mesmo deixar de pagar aos concessionários.

No tema fiscal, e na redução da Taxa Social Única, inscrita no programa de Governo, Passos ganhou a única batalha contra Thomsen, que desistiu de querer criar emprego à custa do corte na TSU. 

Sobretudo, porque o corte na TSU obrigaria a uma maior carga fiscal: maior do que aquela que os portugueses sentem já na pele, com a reclassificação das tabelas do IVA, a diminuição dos benefícios fiscais e o aumento do IRS.


Abrangência real dos salários negociados pelos sindicatos tem os dias contados. Troika exige “plano” para evitar bloqueios

 

A troika quer “garantir” que as negociações salariais passem a ser feitas a nível de cada empresa e que a contratação coletiva sectorial perca a expressão que hoje tem.

O “ataque às convenções coletivas”, como dizem os sindicatos, já está a ser delineado, havendo inclusive duas medidas que terão de estar prontas até 30 de junho, no âmbito da quinta a avaliação, que já está a decorrer.


Hoje, dia em que o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, apresenta os resultados do quarto exame ao plano de ajustamento, o Governo já trabalha em novas regras para definir “critérios e modalidades para a extensão dos acordos coletivos” e prepara “um estudo independente” para  perceber como se pode “limitar a vigência dos contratos que não são renovados”. O estudo sobre a suposta falta de representatividade dos sindicatos e dos acordos coletivos também está no prelo.

Nesta quarta avaliação, que deverá ser “positiva”, libertando mais quatro mil milhões do envelope dos 78 mil milhões de euros, a ênfase recaiu sobre o “problema” da rigidez do mercado de trabalho e sobre os salários relativamente elevados que tiram competitividade à economia, disseram os chefes de missão.


De acordo com o programa da troika, até final deste mês o Governo tem de “submeter uma proposta preliminar com critérios e modalidades para a extensão dos acordos coletivos”. A extensão dos acordos existentes esteve congelada durante alguns meses, mas o Governo desbloqueou entretanto a situação, publicando as chamadas portarias de extensão, depois de as analisar caso a caso.

Mas a ideia é ir mais longe. O estudo sobre a “representatividade dos sindicatos” deverá mostrar há demasiados trabalhadores (não filiados) a beneficiar indiretamente da indexação salarial negociada. O Governo já sinalizou que quer romper com isto e limitar o benefício aos efetivamente sindicalizados.


O ministério da Economia diz que “em 2011 foram publicados 182 instrumentos de regulamentação coletiva [...] aplicáveis a setores de atividade e empresas com um total de 1 236 919 trabalhadores”. Mas os convénios em vigor (para além dos que entraram em 2011) deverão abranger ao todo mais de dois milhões de pessoas.


Por outro lado, há todo um conjunto de medidas que visam desconcentrar a negociação de salários. E aqui a troika não quer facilitismos. Daqui a um ano, o memorando exige que “se necessário, será preparado um plano de ação que garanta que as comissões de trabalhadores podem negociar salários a nível da empresa” caso a dinâmica esperada não aconteça ou fique bloqueada.
Lisboa comprometeu-se ainda até 30 de junho “a preparar uma revisão independente sobre como revigorar a concertação tripartida ao nível dos salários e como encurtar o tempo de sobrevivência dos contratos que expiram, mas não são renovados”.


Megadívida de Durão Barroso paga este mês
Nos últimos anos, todos os governos têm ido ao mercado pedir mega-empréstimos. Mas este mês, com a crise ao rubro e o país numa situação financeira débil,  chega a fatura de uma emissão de obrigações a dez anos. Será o mês mais difícil do ano para os cofres públicos. No próximo dia 15, Portugal terá de amortizar quase 8,7 mil milhões de euros de uma só vez relativos a um empréstimo contraído pelo Governo de José Durão Barroso em junho de 2002, dois meses depois de ter chegado ao poder. Para aliviar estes apertos, Portugal tem continuado a ir aos mercados, mas de curto prazo. Esta semana vai pedir até um máximo de 1,5 mil milhões de euros através de bilhetes do Tesouro que terá de pagar dentro de seis meses e um ano.

Como vai ser a quinta avaliação

Mercado de trabalho - Na quinta avaliação, que termina a 30 de junho, o governo terá de avaliar as medidas para combater o desemprego e desenhar um “plano de ação” para melhorar o que já está no terreno. A descida da TSU para os jovens com menores salários é uma delas.


PPP - A transferência de riscos dos privados para o Estado continua a ser um problema. A troika exige um relatório mais alargado sobre a situação das parcerias público privado e sobre as concessões rodoviárias.

Financiamento - Revisitar o problema do financiamento às PME, analisando o impacto das atuais linhas de crédito e outras medidas neste sector que representa mais de 90% do tecido produtivo. Finalizar as regras de acesso ao capital público por parte da banca.

Estado e sector público - Preparar uma estratégia para desmantelar a Parpública, privatizar a CP Carga, avançar com uma segunda fase de reestruturação do Estado e institutos, receber planos de redução de dirigentes das câmaras, reforçar poderes do Fisco.


Impostos e tarifas - Acabar com todas as isenções no ISP (imposto sobre a energia), rever a eficácia das taxas reduzidas (ISP) para avaliar a sua continuidade. Publicar as fórmulas que definirão as atualizações futuras das tarifas na energia.

 

Vítor Gaspar tira poder aos Ministérios e fica a saber tudo sobre reformas, admissões, saídas e gastos com salários em tempo real

 

Muito em breve todos os trabalhadores do Estado passarão a receber os vencimentos através de um único organismo. O projecto-piloto arranca já em Junho e por enquanto vai apenas envolver o Ministério das Finanças e cerca de 11 organismos tutelados por este. Mas a ideia é alargar o sistema a toda a administração central, o que permitirá um controlo muito mais eficaz sobre os salários e o número de pessoas que trabalham no Estado central.


O actual sistema, que permitiu a divulgação de uma série de dados sobre o sector, foi feito com base num reporte dos serviços e com base num sistema certificado pelo Instituto Nacional de Estatística, seguindo os conceitos do INE e abarcando todas as entidades que integram as contas nacionais.

“É um sistema bastante fiável”, disse o secretário de Estado da Administração Pública ao i. “Mas o facto de os pagamentos serem feitos através de um único organismo torna a informação muito mais fidedigna, permitindo-nos acompanhar mensalmente o que se passa com os recursos humanos da administração central.”


O método é utilizado há vários anos na maior parte dos países europeus, o que permite aos respectivos governos terem o cenário real das admissões, reformas, saídas e gastos com salários em tempo real. Em Portugal, recorde-se, o primeiro recenseamento da função pública foi feito durante o primeiro governo de António Guterres, em 1996, tendo seguido uma metodologia idêntica à dos romanos: o quadro foi traçado para um único momento, de acordo com as informações fornecidas pelos serviços, mas sem continuidade no tempo, permitindo, no entanto, descobrir finalmente o número real de trabalhadores do Estado, idades e formação. Na altura havia 500 535 trabalhadores na administração central, 102 687 na local e 16 177 nos Açores. Foi também possível concluir que 30,5% dos recursos humanos do Estado tinham apenas a escolaridade obrigatória e 34,8% formação superior. Os trabalhadores da função pública representavam então 12,3% do emprego total. No primeiro trimestre deste ano, e de acordo com os dados divulgados a semana passada, existiam 608 746 funcionários no Estado, correspondentes a 13,4% da população empregada.


O censo de 1996 revelou igualmente uma realidade escondida durante anos pelos diversos governos. A existência de milhares de trabalhadores no Estado a recibo verde há muito mais de três anos e que foi preciso integrar nos quadros. Ainda durante a governação de Guterres foi feito um segundo levantamento, mas a partir daí a função pública ficou em roda livre, à mercê de um mecanismo de progressões automáticas, tornando impossível qualquer controlo sobre a massa salarial, o que durante anos tornou imprevisível o resultado das contas públicas.


Com o novo sistema, que o Ministério das Finanças pretende começar a implementar a partir do próximo mês, será dado mais um passo no sentido da transparência do emprego público. O facto de o INA (Direcção-Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas) passar a definir e controlar as políticas de recrutamento públicas, criando condições para a implementação do recrutamento centralizado, além de planear a formação e gerir a nova mobilidade, incluindo ao nível dos dirigentes superiores, que vão passar a ser escolhidos pela Comissão de Recrutamento e Selecção da Adminis- tração Pública, será mais um passo para a revolução no Estado.

O INA será dirigido por um director-geral, um subdirector geral e cinco dirigentes intermédios, estabelece o diploma.


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