Cerca de 80% dos estagiários da terceira edição do Programa de Estágios Profissionais do Estado considera que a experiência adquirida é desvalorizada nas entrevistas de emprego.
Oito em cada 10 dos inquiridos continuam desempregados desde que terminaram o estágio na Administração Pública. A maioria, há mais de seis meses. Esta é uma das conclusões do primeiro estudo sobre a empregabilidade e funções dos ex-estagiários do Programa de Estágios Profissionais na Administração Pública Central (PEPAC), elaborado pelo Movimento PEPAC, um grupo constituído pelos 782 estagiários inscritos na terceira edição do programa.
Numa amostra de 207 estagiários, o estudo divulgado nesta quarta-feira indica que metade diz ter suprido necessidades permanentes na Administração Pública, “tendo exercido as mesmas tarefas e funções nas mesmas condições que os restantes técnicos superiores ao longo de todo o estágio”, lê-se no documento.
Depois de ter sido colocada a hipótese de os estagiários do PEPAC poderem ficar de fora do concurso ao Programa de Regularização Extraordinária de Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP), os estagiários reclamam ser tratados como os precários, pois dizem ter ocupado postos de trabalho permanentes.
Para João (que pede para não ser identificado pelo nome verdadeiro), do Movimento PEPAC, os números não são surpreendentes, mas não esperava que “fossem tão graves”. 87% dos inquiridos considera que o PEPAC não lhe deu oportunidades de emprego e 47% diz não ter sido seleccionado para qualquer entrevista de emprego, dentro ou fora da sua área de estudos.
E o PEPAC é valorizado nas entrevistas de emprego? 82% diz que o programa não lhes permite desenvolver competências úteis para o exercício de funções no sector privado. Segundo o documento, o estagiário é considerado como não tendo qualquer experiência profissional e só poderá ser elegível para outro programa de estágio se concluir um grau académico superior ou distinto do actual.
José Abraão, secretário-geral da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP), considera que os estágios continuam a ser benéficos “no fornecimento de experiência e no contacto com o trabalho”, mas agora há um problema: “A taxa de empregabilidade é baixa, em concreto na Administração Pública, muito por consequência das limitações às admissões”.
Segundo o dirigente da FESAP, a elevada taxa de não empregabilidade que os resultados revelam pode estar relacionada com a conjuntura vivida no país: “Antes do período de ajustamento financeiro, houve momentos em que o nível de sucesso relativamente ao emprego dos estagiários foi muito significativo. A partir do momento em que veio o programa de ajustamento financeiro, resultou daí constrangimentos às admissões, e, naturalmente as coisas dificultaram-se”, explica.
As dúvidas e contradições
O Movimento PEPAC enviou, juntamente com os resultados do estudo, um documento que contém “algumas contradições e incoerências relativamente aos últimos avanços (ou retrocessos) perante o PREVPAP”, para três sindicatos (Frente Comum, Federação de Sindicatos da Administração Pública e Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado), a diversos ministros — cujos ministérios estão a usufruir destes estágios – e aos partidos políticos com assento parlamentar.
Para os estagiários do PEPAC, o Governo está a ser contraditório no que diz. Após ter sido garantido que a regularização extraordinária de precários do Estado iria abranger os trabalhadores integrados em estágios profissionais, desde que estejam a assegurar necessidades permanentes, o Movimento diz que a proposta aprovada em Conselho de Ministros, a 29 de Junho, revelou o contrário.
Segundo a proposta de lei nº91/XIII, as funções exercidas pelos estágios profissionais na Administração Pública podem “satisfazer necessidades permanentes e (…) os vínculos contratuais são adequados ao exercício das funções em causa, independentemente de as necessidades para cuja satisfação concorrem serem temporárias ou permanentes”.
Como um dos critérios para a integração no PREVPAP é que o trabalhador desempenhe funções “correspondentes a necessidades permanentes (…) sem o adequado vínculo jurídico”, o Governo acaba por excluir os estagiários do processo de regularização, argumenta o Movimento.
Para João, a situação está a levar a uma perda crescente de confiança no processo: “É tudo muito incoerente e revela uma falta de transparência que nos deixa um pouco reticentes sobre aquilo em que devemos acreditar ou não”.
O PÚBLICO tentou contactar o Ministério das Finanças, que tutela o INA – Direcção-Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Função Pública, a entidade que gere o PEPAC, mas não obteve resposta em tempo útil.
José Abraão, da FESAP, explica que este é um trabalho que ainda está numa fase inicial e reforçou que “este programa de avaliação dos precários destina-se a avaliar o caso de cada um” e só a partir dos requerimentos e das listas de serviços é que se pode avaliar se os estagiários satisfizeram necessidades permanentes e se o vínculo que tinham era adequado.
O secretário-geral garante que a federação vai sempre defender a integração de “todos aqueles que satisfazem verdadeiramente necessidades permanentes de serviço e o seu vínculo é inadequado”.
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