Presidente anunciou que irá dissolver a Assembleia e até já tem data para as legislativas: 30 de janeiro. André Pardal, sócio da Legalworks Gomes da Silva, explica como o país vai funcionar e quais são as próximas ações.
"Pela primeira vez, na vigência da atual Constituição de 1976, o Orçamento de Estado foi chumbado pela Assembleia da República. Nesse sentido, e dado o quadro inédito, o País entrou numa crise orçamental? E política? Poderia ser diferente?
Com a rejeição da Lei do Orçamento para 2022 no Parlamento, nem o Governo, nem a Assembleia da República cessam, automaticamente, as suas funções. Assim, não se demitindo, o Governo manter-se-á em plenas funções, até à efetiva dissolução do Parlamento. Como assistimos nos últimos dias, neste quadro, é o Presidente da República, nos termos constitucionais, quem assume um maior protagonismo, como verdadeiro garante do cumprimento da Lei Fundamental.
Relativamente à Assembleia da República, nada obrigaria à sua dissolução (como recentemente foi anunciado), poderia ter sido efetivamente seguido outro caminho, em particular, convidar o Governo a apresentar outra Proposta de Orçamento ou, ainda, convidar (no atual quadro parlamentar) o Partido Socialista (Partido mais representado no Parlamento) a formar outro Governo (uma vez que o mandato dos atuais Deputados só terminaria daqui por 2 anos).
Após a auscultação aos Partidos Políticos (todos os representados na Assembleia da República, mais o Partido Livre), a audição dos Parceiros Sociais e a consulta - obrigatória - do Conselho de Estado, entendeu Marcelo Rebelo de Sousa que esta solução governativa (que tomou posse em outubro de 2019, mas que, na prática, já perdura desde novembro de 2015) estaria esgotada, e que, o melhor seria devolver a "voz" aos portugueses, chamando-os às urnas no próximo dia 30 de janeiro. Mas porquê nessa data?
Estabelece a Constituição que - em caso de dissolução do Parlamento - a convocação de eleições legislativas terá de ocorrer entre o 55º e o 60º dia subsequentes à publicação do decreto de dissolução, que, previsivelmente, só acontecerá no final do mês de novembro.
Nesse sentido o Presidente entendeu, respeitando não só a quadra natalícia, como a legislação relativa aos debates entre representantes partidários (para um melhor esclarecimento dos portugueses), como, ainda, os períodos eleitorais internos (já marcados) de alguns Partidos Políticos (entre os quais o Principal Partido da Oposição), agendar as referidas eleições para 30 de janeiro.
Como tal, as Listas de Deputados (obrigatoriamente candidatos por Partidos Políticos ou Coligações entre os mesmos) deverão ser entregues até ao 41º dia anterior à data das eleições, ou seja, até 20 de dezembro.
E, como será gerido o País nesta fase? Em duodécimos (dividindo o Orçamento do ano anterior pelos 12 meses do ano)? E o Parlamento? Poderá aprovar Legislação?
Com a Dissolução do Parlamento apenas funciona a sua Comissão Permanente, que é composta pelo Presidente, Vice-presidentes e um número de deputados propostos pelos partidos com assento parlamentar, de acordo com a respetiva representatividade, nos termos do Artigo 179.º da Constituição, tendo esta apenas poderes fiscalizadores e não de aprovação de legislação.
No que diz respeito ao Orçamento de Estado, até dia 31 de dezembro, o País tem um Orçamento aprovado, e em vigor. A partir dessa data entrará, de facto, num regime de duodécimos, podendo, contudo, o Governo (no uso das suas competências), por exemplo, aumentar salários na Função Pública ou - inclusivamente - estabelecer (por Decreto-Lei) um Regime Transitório de Execução Orçamental onde preveja a aplicação de parte do PRR (a famosa "bazuca"), antecipando alguns dos "duodécimos", não estando, de todo, apenas circunscrito a duodécimos do Orçamento anterior.
Da composição da Assembleia da República resultante do ato eleitoral marcado para 30 de janeiro, emanará assim um Governo que deverá tomar posse (a Constituição não fixa nenhum prazo máximo) até ao meio do mês de fevereiro.
Seguir-se-á, então, a discussão e votação do Programa de Governo e, após a sua aprovação no Parlamento, este terá (de acordo com o previsto na Lei de Enquadramento Orçamental) 3 meses para entregar um novo Orçamento de Estado.
Assim, em suma, previsivelmente, apenas em final de junho, início de julho o País terá um novo Orçamento de Estado em vigor."