Serão os professores a decidir se querem ir pela via mais rápida ou pela mais lenta e, sobretudo, caberá ao Parlamento a decisão sobre qual o tempo de serviço que irá acabar por ser recuperado.
Mais de 70% dos professores que iriam progredir em 2020, apenas por vida do descongelamento das carreiras, poderão antecipar a subida de escalão já para este ano. Estas são as contas a que chegou o Governo, mas que têm na base um pressuposto que ainda não está garantido: os professores aceitarem o modelo aprovado pelo executivo no passado dia 4 de Abril, que permite às carreiras da defesa, da justiça e da administração interna recuperar uma parte do tempo de serviço congelado entre 2011 e 2017.
As previsões do Governo poderão ainda sair furadas pelo que vier a ser decidido pela Assembleia República, no âmbito da apreciação parlamentar do diploma de Março destinado aos docentes, que consagrou a recuperação de dois anos, nove meses e 18 dias dos nove anos, quatros meses e dois dias exigidos pelos professores.
Este processo, requerido por todos os partidos à esquerda e à direita do PS, inicia-se nesta terça-feira com o objectivo declarado de proceder a alterações no diploma de modo a consagrar a recuperação integral do tempo de serviço. Mas não é ainda claro quando e em que moldes. Seja como for, a decisão que vier a ser tomada terá impactos nas outras carreiras.
Quanto ao diploma aprovado este mês pelo Governo para as outras carreiras especiais, que o executivo decidiu também alargar aos professores caso estes assim o desejem, refira-se que à semelhança do que aconteceu com os docentes também não acolhe a contagem integral do tempo de serviço exigida pelos sindicatos e associações profissionais.
Em vez disso, o Governo decidiu que vão receber 70% do tempo que demoram em média a subir de escalão e que difere consoante a carreira. Por exemplo, um juiz desembargador, que leva em média cinco anos para subir de escalão, receberá um bónus de tempo de três anos e seis meses. Nas forças armadas, há oficiais que recuperam um ano, quatro meses e 24 dias, enquanto outros postos recuperam um ano e 11 meses. No caso dos professores serão os dois anos, nove meses e quatro dias já fixados anteriormente com base no mesmo exercício.
Este tempo será atribuído em três momentos diferentes aos trabalhadores: um terço em Junho de 2019, outro terço em Junho de 2020 e outro em Junho de 2021. A outra alternativa, para os professores, é a de escolherem a solução imposta no diploma de Março, se este sobreviver ao Parlamento. Estabelece-se aí que docentes recebem de uma só vez o tempo congelado, mas que tal só começará a ser aplicado nas progressões registadas a partir de 1 de Janeiro de 2019. O que torna praticamente inviável a existência este ano de progressões devidas à recuperação do tempo. E leva a que os cerca de 46 mil que progrediram em 2018 tenham de esperar quatro anos para beneficiar da recuperação do tempo de serviço e, por essa razão, indicou a Secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, “poderão ter mais vantagens em escolher” o modelo aprovado para as outras carreiras. Na prática, a solução do diploma de Março quase só terá vantagens para os cerca de 13 mil professores que têm progressões garantidas em 2019, devido ao descongelamento das carreiras, e que por essa razão ficarão já a contar este ano com a totalidade dos dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço em vez de receberam apenas um terço.
Os professores terão de comunicar até 31 de Maio que modelo escolhem. A Federação Nacional de Professores (Fenprof) já apelou a que o façam “sob protesto”, entregando uma declaração onde frisem que não prescindem dos quase sete anos do tempo de serviço congelado que foram “apagados” pelo Governo e já prometeu que irá divulgar uma minuta para essa comunicação.
Progressões duplicam
Caso o modelo a seguir seja o que foi aprovado para as outras carreiras, isto significa que os professores poderão ver contabilizados, já em Junho, 11 meses dos cerca de 33 meses que o Governo aceitou recuperar. Como o tempo de permanência em nove dos 10 escalões da carreira docente é de quatro anos, os cerca de 23 mil professores que deveriam progredir em 2020 já estão em contagem final para alcançar este prazo,
E, por isso, ao ser-lhes creditados em Junho mais 11 meses, cerca de 17 mil poderão antecipar a progressão, indicou o Secretário de Estado do Orçamento João Leal. “Quase todos os professores que iam progredir em 2020 passam a progredir em 2019”, garantiu.
A Fenprof já avisou que tal só será possível se o Governo definir “um regime excepcional” no que respeita às progressões, já que estas dependem também, “para além do tempo de serviço, de outros requisitos como a formação contínua, a avaliação de desempenho e, em alguns escalões, a observação de aulas e ou obtenção de vaga”. A não existir um “regime excepcional, o impacto da antecipação para 2019 será pouco expressivo”, conclui a Fenprof.
O Governo para já insiste que o número total de professores que poderá progredir em 2019 passará dos cerca de 13 mil inicialmente previstos devido ao descongelamento para perto de 30 mil. Este efeito multiplicador será comum a todas as carreiras em que as progressões dependem sobretudo da contagem do tempo de serviço. Para além dos professores, existem mais cinco: magistrados judiciais; magistrados do Ministério Público; oficiais de justiça; militares das Forças Armadas e militares da GNR.
No conjunto destas carreiras especiais, as progressões vão duplicar este ano em relação ao que estava previsto antes da aprovação dos dois diplomas que consagram a recuperação do tempo congelado nas carreiras especiais, adiantou João Leal. Contas redondas: serão cerca de 60 mil os funcionários públicos que vão subir de escalão em 2019 de um universo que ronda os 160 mil, disse.
Impacto de 40 milhões em 2019
Dos cerca de 60 mil que vão progredir, metade serão professores, isto se optarem pela solução encontrada para as outras carreiras. E cerca de oito mil pertencem à GNR (estavam previstas 3600 progressões). O Governo não apresentou ainda números quanto ao impacto da contagem do tempo nas progressões esperadas para os magistrados, oficiais de justiça e militares das Forças Armadas.
O novo diploma também já foi contestado pelos sindicatos. Algumas reacções: “um roubo é sempre um roubo”, sintetizou o líder da Fenprof, Mário Nogueira; “manifestamente insuficiente”, comentou o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, António Ventinhas, a propósito do diploma aprovado este mês pelo Governo.
Segundo o Governo, esta solução vai custar 40,3 milhões de euros em 2019, um valor que está “dentro da margem que é possível acomodar” no Orçamento do Estado, garantiu João Leal.