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A formiga no carreiro

Magistrados temem que acções cautelares fiquem mais “morosas” e propõem um “juízo de possibilidade”.

O Ministério da Justiça quer tornar mais rigorosa a análise e aprovação das providências cautelares, definindo que para aceitar a suspensão de um acto ou decisão administrativa o juiz terá de formar a convicção de que a acção principal tem probabilidade de ganhar. A proposta consta do pedido de autorização legislativa que Paula Teixeira da Cruz sujeitou à aprovação do Parlamento para alterar o Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA).

 

Os juízes mostram "reservas" ao critério e os advogados reconhecem que "aperta os requisitos" das providências. Numa altura em que estas acções cautelares estão na moda como instrumento dos cidadãos, movimentos e sindicatos para travar decisões da Administração Pública e do Governo (veja-se o caso da privatização da TAP), o Ministério da Justiça quer rever o regime e tornar mais difícil uma decisão favorável. Actualmente, para algumas providências, já existe o critério da probabilidade do sucesso da acção principal. Mas só se usa em acções cautelares muito específicas e quando é "manifestamente" notório que o acto contestado é ilegal. A regra nas providências é que baste ao juiz considerar que a acção principal interposta após a providência tem algum fundamento.

Aceite a providência (que é a regra no ordenamento jurídico português) é determinada a suspensão do acto ou decisão contestada: pode ser uma obra, uma privatização, o fecho de uma maternidade ou arealização de um exame. A proposta que Paula Teixeira da Cruz apresentou ao Parlamento aplica o mesmo critério (o mais gravoso) a todos os casos. Deixa cair a mera possibilidade de o processo principal ser procedente e impõe que o juiz tenha indícios claros da probabilidade do requerente ganhar a acção principal (por exemplo, é provável que a privatização de uma empresa seja considerada ilegal ou que um exame seja declarado inconstitucional).

Além deste critério, o juiz analisa se está em risco um bem jurídico ou o interesse público. No parecer que a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) enviou ao Governo, a que o Diário Económico teve acesso, cinco magistrados dos tribunais administrativos mostram "reservas" ao critério escolhido, porque vai obrigar logo numa fase prévia a "uma análise mais aprofundada da bondade da pretensão deduzida na acção principal", o que, avisam, vai tornar as decisões nas acções cautelares mais demoradas. Isto porque, alegam, "para obter uma decisão segura" sobre a probabilidade da vitória da acção principal "passará a ser necessário, em muitos casos, abrir uma fase de produção de prova".

 

Os juízes confirmam que este critério "dificultará muito" a procedência de providências cautelares e pedem à ministra que opte pelo critério pela negativa, bastando ao juiz considerar "não ser provável a falta de fundamento da acção principal". Ou seja, bastaria ao juiz considerar que a acção principal pode ter fundamento.

 

A advogada Marisa Mirador, especialista em Direito Administrativo, acrescenta que os magistrados terão de fazer logo uma "análise mais profunda" do direito e da pretensão que está em causa, quando agora é "mais superficial", mas lembra que também os advogados terão de apresentar logo na acção cautelar mais matéria de facto e de direito que sustente "a viabilidade da acção principal". Ao Económico, a advogada admite que o objectivo do Governo é o de tornar "mais exigente" a aceitação de providências cautelares, cujo regime foi alargado na reforma de 2004. Nesse ano, era Governo uma coligação PSD/CDS, vários magistrados alertaram para o risco de ser facilitado o acesso a estas acções, porque os juízes estavam a ser transformados em avaliadores das decisões públicas e políticas. E os receios confirmaram-se.

Nos últimos anos, os tribunais administrativos foram inundados de providências a impugnar e travar decisões dos executivos e autarquias. Foi o caso do Túnel do Marquês, da Maternidade Alfredo da Costa, da retenção de 5% de IMI, da nova sede da PJ, do acordo ortográfico, e, mais recentemente, da privatização da TAP. A todas, os governos foram respondendo com a figura da resolução fundamentada e com o interesse público, mas também esta figura vai agora ser revista.

 

 

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